sábado, 2 de fevereiro de 2013

Ilclênia Campos - SÍNTESE do texto “Viver é recriar”: um diálogo sobre a educação indígena." (Livro Pedagogia da Tolerancia - Paulo Freire, 2004).


  UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB
DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO CAMPUS VIII/ PAULO AFONSO
LICENCIATURA INTERCULTURAL EM EDUCAÇÃO ESCOLAR INDÍGENA – LICEEI
Componente Curricular: Linguagem
Docente: Maria Nazaré Mota de Lima
Discente:Ilclênia Campos 
Povo Indígena:Tuxá
SÍNTESE: 


 
TENTATIVAS INCANSÁVEIS DE TRITURAR E DOMINAR A CULTURA DO DOMINADO

O livro de Paulo Freire, Pedagogia da Tolerância em seu texto “ Viver é recriar”: um diálogo sobre a educação indígena”, traz em seu primeiro parágrafo algo que me chamou muito a atenção “Triturar a identidade cultural do dominado”, frase essa que nos faz pensar o quanto o dominador é cruel. Ele tenta nos matar de todas as formas, historicamente, culturalmente e espiritualmente, trazendo nossa história prontinha, contada com o olhar dele e da maneira que lhe convém, fazendo nós pensarmos que ele é bonzinho para depois discriminar, inferiorizar e nos deixar invisíveis, enfraquecidos...
Durante algum tempo essa concepção e estratégia prevaleceu, mas hoje não toleramos mais esse tipo de manipulação e agressão, e um exemplo visível é a fala do índio Xavante “se vocês vêm pra cá oferecer pra gente os primeiros anos de escola, para a gente virar operário de vocês, a gente quer agora estudos para que possamos ser médicos, engenheiros, padres, bispos; não é só vocês não...” . A meu ver, as palavras do Xavante nos mostra que a Educação Indígena não tem ponto de chegada. E que não deixaremos mais que o dominador diga até onde nós podemos chegar e até onde a nossa capacidade vai, porque agora entendemos perfeitamente que quem tem que saber até onde queremos ir somos nós. E o céu é o nosso limite. Cada vez mais estamos nos apropriando, e usando como instrumento de poder, o conhecimento universal para podermos escrever e ser protagonista de nossa própria história e ocuparmos os espaços que antes eram ocupados somente pelos dominadores, espaços esses que também são nossos, havendo a “desordem estabelecida”.
Outra questão interessante é a forma que o autor usa para falar da “manha”, dizendo o seguinte: “Se não fossem às manhas, os oprimidos se acabariam, não dava para sobreviver. A violência dos exploradores é tal que, se não fossem as manhas, não haveria como aguentar o poder e a negação que se encontram pelo país”. Nós povos indígenas, na maioria das vezes, somos obrigados a usar dessa manha para sobreviver e não sermos mais dominados nessa e nas gerações futuras. Um exemplo de manha, no bom sentido, são as aulas de cultura, religiosidade (espiritualidade) que são ministradas e praticadas em nossas escolas, um direito assegurado nas Diretrizes Nacional de Educação Escolar Indígena. As pessoas não entenderiam nossas especificidades e nos julgariam, em meu território já tivemos que usar dessas manhas diversas vezes, mesmo sabendo que é uma “violência” contra o meu povo e nossa cultura, o povo Tuxá/Banzaê é muito voltado para a ritualidade, se envolve como um todo, além de ser uma das formas de nos mantermos unidos, nos preocupando uns com os outros e ficando mais perto de Deus e de nossos encantos. Pois bem, um certo dia, chega uma médica na aldeia e diz que estamos fumando demais e que não deveríamos fumar tanto, principalmente as crianças, porque a fumaça nos mataria, alguns ficaram pensativos, outros com raiva, mas a minha resposta foi imediata, e eu disse:” nós não fumamos o tempo todo, fumamos somente nos rituais”. Usei de manha para me sair daquele julgamento da médica, mesmo sabendo que o que eu dizia não era verdade, mas eu tinha necessidade e nem queria explicar a ela o sentido de nossas rodas de cachimbo (poró); muito menos a faixa etária que cada criança passa a fazer parte dos rituais, assim como ansiedade delas para que chegue logo a idade para serem inseridas.
Paulo Freire traz também o questionamento a respeito do discurso e da prática, dizendo: “não é o discurso que valida à prática, é a pratica que valida o discurso”. Assim temos que ter a consciência de que o discurso precisa estar conectado com a prática, e que não é interessante pregar algo e praticar outra coisa. Um exemplo disso somos nós, estudantes indígenas da LICEEI, que estamos em uma Universidade fazendo um curso especifico diferenciado, inovador dizendo que faremos a diferença; no entanto, muitas vezes nos deparamos com situações as quais vão de encontro a nosso discurso e, simplesmente aceitamos sem questionar, balançando as cabeças feito lagartixas. Outro exemplo é a situação de descaso pela qual passamos em nossas escolas indígenas, pois somos sabedores das leis, as quais asseguram nossos direitos enquanto professores de uma instituição temos nossos discursos afiadíssimos baseados nelas, mas a prática é outra, na medida em que nós somos ludibriados, manipulados e engolimos a seco as regras impostas pelo estado, e ele nos diz:” ou você aceita, ou você aceita”. Neste caso, está difícil até usar de manha.
Foi gratificante e prazeroso ler o texto, até porque ele nos faz refletir sobre a nossa realidade e o quanto somos dominados. Ele tem o poder de nos encorajar e nos induz a agir diante da forma como as coisas estão postas. Recomendo que professores e alunos leiam, porque ele é contagiante e instigante.

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