UNIVERSIDADE
DO ESTADO DA BAHIA – UNEB
DEPARTAMENTO
DE EDUCAÇÃO, CAMPUS X
LICENCIATURA
INTERCULTURAL EM EDUCAÇÃO ESCOLAR INDIGENA – LICEEI
COMPONENTE CURRICULAR: Letramentos
e alfabetização na escola indígena: teorias e práticas.
DOCENTE: MARIA NAZARÉ MOTA DE LIMA
Nádia
Batista da Silva [1]
Ramon Souza Santos[2].
O
processo de alfabetização entre os Tupinambá de Olivença: para quê e para quem
alfabetizar?
O
ato de ler e escrever deve começar a partir de uma compreensão muito abrangente
do ato de ler o mundo, coisa que os seres humanos fazem antes de ler a palavra.
Até mesmo historicamente, os seres humanos primeiro mudaram o mundo, depois
revelaram o mundo e a seguir escreveram as palavras." (Paulo Freire)
Foi através dessas reflexões acima citada, que
relatamos as nossas experiências enquanto professores/alfabetizadores(as)
indígenas iniciadas com a EJA a partir da década de 1990, junto ao CAPOREC (Coletivo
de Professores Populares da Região Cacaueira), foi formado a partir da vinda de
Freire aqui na região em 1992. Ele
também foi quem nos estimulou a pensar sobre qual a educação que queremos pra
nossa comunidade e enquanto povo nos fez
refletir a Educação Escolar Indígena, e seus, desafios num contexto maior que é político,
social e econômico.
A iniciativa desse processo de alfabetização na EJA, em paralelo
com crianças em classes multisseriadas acompanhamos muitas famílias onde, parte das crianças
que nunca havia estudado, e dentre elas,
algumas ainda não tinham contatos com a sociedade
fora da aldeia ( Olivença), pois viviam mata adentro devidos aos massacres que
ocorreram no decorrer da história fazendo com que as gerações
que antecederam aos seus pais, ao optarem pela sobrevivência foram
brutalmente obrigados a viverem isolados e negando a sua identidade cultural,
com medo de serem torturados como os nossos ancestrais. Havia um número
representativo de pessoas que considerávamos letrados de conhecimentos
específicos da nossa cultura,e que precisava ser colocados em evidências,
trazendo como conteúdos e fazendo de cada um (a) protagonistas das nossas
histórias. Foi um parto, mas, para ter a resposta, de qual a educação que
queremos, tinha que ser com eles(a), e para eles, refletindo o papel social de
cada um(a) nesse processo de construção de uma educação contextualizada que
gritava dentro de todos(a), estamos aqui, e queremos respeito.
No momento em que percebemos a
importância da educação, e do direito que temos garantidos na Constituição
Federal, inicia-se uma nova perspectiva, e consciência daquele momento da
apropriação do protagonismo do nosso povo, que em sua maioria adulta não tinham
se quer documentação, ou seja, não existíamos para a sociedade civil enquanto
cidadãos de direitos. Foi nesse processo de educação, nessa apropriação desses
direitos que refletimos, e nos colocamos na condição de protagonismo
indígena da nossa própria história com a
identificação das famílias e da Terra Indígena Tupinambá, as visitas aos mais
velhos e anciãos, que ainda resistiam como verdadeiras bibliotecas vivas e com
as informações precisas para o fortalecimento, organização também o
reconhecimento de uma educação tupinambá que já existia, informalmente na
Aldeia de Sapucaieira.
Começamos a construir o nosso
material didático específico, juntamente com os educandos ,professores e outras
lideranças da comunidade pois era envolvidos nessa dinâmica coletiva em
detrimento de uma educação que agrega valores. Esse desafio nos proporcionava uma
perspectiva como a de plantar uma enorme árvore que futuramente daria os tão
esperados frutos, que alimentaria essa educação refletida e praticada naquele momento. Foram realizadas várias
oficinas nos momentos pedagógicas para a confecção dos primeiros materiais
didáticos usando materiais recicláveis
como: caixa de fósforo vazias pra confeccionar jogos silábicos, jogos matemáticos,
caixa de contagens usando variedades sementes e formas para trabalhar cálculos,
jornais, revistas para jogo da memória entre outros. Começamos nos apropriar de algo que nunca
poderíamos imaginar, principalmente da escrita, e o mundo dos alfabetizados,
acabar com esse dito popular que Santo de casa não faz milagre ,e
principalmente que falamos errados os alunos percebiam que podíamos ir muito mais além com a
valorização cultural, fortalecimento étnico, lutar por uma política social e
ambiental fomentando a auto
-sustentabilidade, a qual contribui com a economia regional na agricultura familiar. Essas informações enriquecia
o nosso conteúdo para as aulas, principalmente para os adultos que sentia a
escola como um complemento do conhecimento que eles já sabiam . Nossa prática
na escola, nos tornaram meros pesquisadores (as) com os alunos, outros
professores (a), lideranças e anciões eles eram e ainda continuam sendo o nosso
respaldo pois, nossas pesquisas que eram
repassadas para os alunos. As aulas diferenciadas são nada mais que, oficinas
de práticas de saberes e trocas de conhecimentos. Conhecimento que eram
transmitidos pelos anciões, verdadeiros Mestres da tradição oral.
A professora Pedrísia que iniciou a
primeira turma alfabetização num espaço improvisado na casa de farinha onde seu
pai Sr. Pedro Brás tirava o sustento da sua família. “Diz Pedrísia:” os alunos
tem contato com o nosso trabalho do dia a dia e é sobre ele que agente constrói
os nossos conteúdos, por exemplo, um aluno escreveu uma letra do ritual
porancim. Ex:
TEM UM MUNZUÁ, PRA MIM OIÁ,
TEM UM MUNZUÁ PRA MIM OIÁ;
EU OIEI TAVA CHEIO DE PIRÁ,
EU OIEI TAVA
CHEIO DE PIRÁ, ( Dito temimba’é)
A letra fala de um sonho, explica o
temimba’é curumim (aluno criança /
tupi) e durante dias foi trabalhada na sala de aula, (casa de farinha) como
tema gerador, pirá que é peixe na
Língua Tupi, e as expressões linguísticas que ainda não tinham relatos sobre o
assunto na aldeia como por exemplo, o português falado na comunidade, percebendo o quanto a academia nos
discriminava.” Ex. (o uso da palavra pecuária,
referindo-se as dificuldades momentâneas como; dificulidade, precária).
A educação diferenciada e comunitária e também
biligue nos impulsionou a outros desafios como; revitalizar a Língua Tupy já
quase esquecida, mas viva no dia a dia
das famílias nas comunidades. Em 2000, começamos a pesquisar a língua tupi a
partir dos vestígios ainda presentes em nossos anciãos, Ex: Xe akaru, ou Xe a ú - quero comer, mandiok’ui vem de mandioca e
quer dizer farinha de mandioca. Esse processo de retomada língua incentivou
mais jovens e adultos a estudar e uma aluna da Eja disse: aprender a ler é a
coisa mais importante de mundo, principalmente se ler o que escreve.( M.M.)
Podemos dizer que o mundo da
escrita nos encanta, e também á aqueles, cujo acesso lhes foram negados ainda
na infância, pelas prioridades da sobrevivência daquela época e hoje são quem
alimenta esse país, organizados como povos e comunidades tradicionais. São os
pequenos (a) agricultores (a) familiares que nos possibilita uma
sustentabilidade e autonomia para quem sabe no futuro mudar essa realidade.
Fica claro que não basta apenas ler e escrever e isso implica, em novas
habilidades de práticas de escrita e compreensão do que se lê.
[1]
Graduanda em Licenciatura Intercultural em Educação Escolar Indígena – LICEEI,
pela Universidade Estadual da Bahia – UNEB. Licenciada em Língua Portuguesa e
Artes pelos Estudos Caxiense - EAD-Salvador.
[2]
Graduando em Licenciatura Intercultural em Educação Escolar Indígena – LICEEI,
pela Universidade Estadual da Bahia – UNEB
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