quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Trabalho em grupo: Nádia Batista da Silva e Ramon Souza Santos




UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB
DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO, CAMPUS X
LICENCIATURA INTERCULTURAL EM EDUCAÇÃO ESCOLAR INDIGENA – LICEEI
COMPONENTE CURRICULAR: Letramentos e alfabetização na escola indígena: teorias e práticas.
 DOCENTE: MARIA NAZARÉ MOTA DE LIMA

Nádia Batista da Silva [1]
 Ramon Souza Santos[2].

O processo de alfabetização entre os Tupinambá de Olivença: para quê e para quem alfabetizar?
O ato de ler e escrever deve começar a partir de uma compreensão muito abrangente do ato de ler o mundo, coisa que os seres humanos fazem antes de ler a palavra. Até mesmo historicamente, os seres humanos primeiro mudaram o mundo, depois revelaram o mundo e a seguir escreveram as palavras." (Paulo Freire)

           Foi através dessas reflexões acima citada, que relatamos as nossas experiências enquanto professores/alfabetizadores(as) indígenas iniciadas com a EJA a partir da década de 1990, junto ao CAPOREC (Coletivo de Professores Populares da Região Cacaueira), foi formado a partir da vinda de  Freire aqui na região em 1992. Ele também foi quem nos estimulou a pensar sobre qual a educação que queremos pra nossa comunidade e enquanto povo  nos fez refletir a Educação Escolar Indígena,   e seus,  desafios num contexto maior que é político, social e econômico.  
 A iniciativa desse  processo de alfabetização na EJA, em paralelo com crianças em classes multisseriadas   acompanhamos muitas famílias onde, parte das crianças que nunca havia estudado,  e dentre elas, algumas ainda  não tinham contatos com a sociedade fora da aldeia ( Olivença), pois viviam mata adentro devidos aos massacres que ocorreram no decorrer da história fazendo com que as  gerações  que antecederam aos seus pais, ao optarem pela sobrevivência foram brutalmente obrigados a viverem isolados e negando a sua identidade cultural, com medo de serem torturados como os nossos ancestrais. Havia um número representativo de pessoas que considerávamos letrados de conhecimentos específicos da nossa cultura,e que precisava ser colocados em evidências, trazendo como conteúdos e fazendo de cada um (a) protagonistas das nossas histórias. Foi um parto, mas, para ter a resposta, de qual a educação que queremos, tinha que ser com eles(a), e para eles, refletindo o papel social de cada um(a) nesse processo de construção de uma educação contextualizada que gritava dentro de todos(a), estamos aqui, e queremos respeito.  
No momento em que percebemos a importância da educação, e do direito que temos garantidos na Constituição Federal, inicia-se uma nova perspectiva, e consciência daquele momento da apropriação do protagonismo do nosso povo, que em sua maioria adulta não tinham se quer documentação, ou seja, não existíamos para a sociedade civil enquanto cidadãos de direitos. Foi nesse processo de educação, nessa apropriação desses direitos  que   refletimos, e nos colocamos na condição de protagonismo indígena da nossa própria  história com a identificação das famílias e da Terra Indígena Tupinambá, as visitas aos mais velhos e anciãos, que ainda resistiam como verdadeiras bibliotecas vivas e com as informações precisas para o fortalecimento, organização também o reconhecimento de uma educação tupinambá que já existia, informalmente na Aldeia de Sapucaieira.
Começamos a construir o nosso material didático específico, juntamente com os educandos ,professores e outras lideranças da comunidade pois era envolvidos nessa dinâmica coletiva em detrimento de uma educação que agrega valores.    Esse desafio nos proporcionava uma perspectiva como a de plantar uma enorme árvore que futuramente daria os tão esperados frutos, que alimentaria essa educação refletida e praticada  naquele momento. Foram realizadas várias oficinas nos momentos pedagógicas para a confecção dos primeiros materiais didáticos  usando materiais recicláveis como: caixa de fósforo vazias pra confeccionar jogos silábicos, jogos matemáticos, caixa de contagens usando variedades sementes e formas para trabalhar cálculos, jornais, revistas para jogo da memória entre outros.  Começamos nos apropriar de algo que nunca poderíamos imaginar, principalmente da escrita, e o mundo dos alfabetizados, acabar com esse dito popular que Santo de casa não faz milagre ,e principalmente que falamos errados os alunos percebiam  que podíamos ir muito mais além com a valorização cultural, fortalecimento étnico, lutar por uma política social e ambiental  fomentando a auto -sustentabilidade, a qual contribui com a economia regional  na agricultura familiar. Essas informações enriquecia o nosso conteúdo para as aulas, principalmente para os adultos que sentia a escola como um complemento do conhecimento que eles já sabiam . Nossa prática na escola, nos tornaram meros pesquisadores (as) com os alunos, outros professores (a), lideranças e anciões eles eram e ainda continuam sendo o nosso respaldo pois,  nossas pesquisas que eram repassadas para os alunos. As aulas diferenciadas são nada mais que, oficinas de práticas de saberes e trocas de conhecimentos. Conhecimento que eram transmitidos pelos anciões, verdadeiros Mestres da tradição oral.
A professora Pedrísia que iniciou a primeira turma alfabetização num espaço improvisado na casa de farinha onde seu pai Sr. Pedro Brás tirava o sustento da sua família. “Diz Pedrísia:” os alunos tem contato com o nosso trabalho do dia a dia e é sobre ele que agente constrói os nossos conteúdos, por exemplo, um aluno escreveu uma letra do ritual porancim. Ex:
TEM UM MUNZUÁ, PRA MIM OIÁ,
TEM UM MUNZUÁ PRA MIM OIÁ;
EU OIEI TAVA CHEIO DE PIRÁ,
                                 EU OIEI TAVA CHEIO DE PIRÁ, ( Dito temimba’é)
A letra fala de um sonho, explica o temimba’é curumim (aluno criança / tupi) e durante dias foi trabalhada na sala de aula, (casa de farinha) como tema gerador, pirá que é peixe na Língua Tupi, e as expressões linguísticas que ainda não tinham relatos sobre o assunto na aldeia como por exemplo, o português falado na comunidade,  percebendo o quanto a academia nos discriminava.” Ex. (o uso da palavra pecuária, referindo-se as dificuldades momentâneas como; dificulidade,   precária).
 A educação diferenciada e comunitária e também biligue nos impulsionou a outros desafios como; revitalizar a Língua Tupy já quase esquecida, mas viva  no dia a dia das famílias nas comunidades. Em 2000, começamos a pesquisar a língua tupi a partir dos vestígios ainda presentes em nossos anciãos, Ex: Xe akaru, ou Xe a ú - quero comer, mandiok’ui  vem de mandioca e quer dizer farinha de mandioca. Esse processo de retomada língua incentivou mais jovens e adultos a estudar e uma aluna da Eja disse: aprender a ler é a coisa mais importante de mundo, principalmente se ler o que escreve.( M.M.)
Podemos dizer que o mundo da escrita nos encanta, e também á aqueles, cujo acesso lhes foram negados ainda na infância, pelas prioridades da sobrevivência daquela época e hoje são quem alimenta esse país, organizados como povos e comunidades tradicionais. São os pequenos (a) agricultores (a) familiares que nos possibilita uma sustentabilidade e autonomia para quem sabe no futuro mudar essa realidade. Fica claro que não basta apenas ler e escrever e isso implica, em novas habilidades de práticas de escrita e compreensão do que se lê.


[1] Graduanda em Licenciatura Intercultural em Educação Escolar Indígena – LICEEI, pela Universidade Estadual da Bahia – UNEB. Licenciada em Língua Portuguesa e Artes pelos Estudos Caxiense - EAD-Salvador.
[2] Graduando em Licenciatura Intercultural em Educação Escolar Indígena – LICEEI, pela Universidade Estadual da Bahia – UNEB

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